sexta-feira, março 01, 2013

CONTAGEM REGRESSIVA PARA UM FUTURO RETRÔ









e nisso que dá toda essa evolução! Essa ânsia por abandonar, como se uma velharia que compromete nossa particular contemporaneidade – logo nós, homens, que não é de hoje que estamos aqui! –, todas as “analogias”, esse recurso que tem lá sua importância na retórica, e tudo isso para que possamos exibir-nos, completamente, digitalizados, como se aptos a nos abrir (ou a nos fechar) a um simples toque, embora já o façamos ao comando da voz, da voz com comando para nos fazer nos abrir ou nos fechar, sendo esta uma tecnologia, ao mesmo tempo, antiga e das mais modernas.

Foi-se o tempo em que podíamos, respiração suspensa, seguir os passos, sempre corridos, de uma jornalista, pau-para-toda-obra, como costuma acontecer com quem quer mostrar serviço, sendo essa, às vezes, a única maneira de se mostrar o que se sabe fazer, correndo de lá para cá, jornal já no ar, em horário nobre, quase a chamar pela matéria que ainda navega, aparentemente, naufraga numa ilha de edição climatizada, sem, ao menos, uma água de coco de clichê ou uma companhia sexy – mais clichê, impossível!

De um lado, espectadores experimentados, sabemos que, na hora agá, tudo há de se resolver, mas, por outro lado, como se fôssemos marinheiros de primeira viagem nessa aventura às escuras, torcemos as mãos, mexemos as cadeiras (as nossas, e as da sala, se estas não estiverem devidamente com os pés bem plantados no chão, nesse ambiente irreal), contando nos dedos os segundos que faltam para que, como se isso ainda exigisse uma eternidade toda, a fita (Beta, U-Matic ou VHS, como a conhecem os que a trata(ra)m mais “domesticamente”), saia de onde está, atravesse corredores cheios de uma gente apressada misturada a uma (mesma?) gente que parece não ter o que fazer, chegando, afinal, onde deve aportar e, enfim, com um toque, tudo vai – ufa! – para o ar.

Agora, de um só ponto, faz-se quase de tudo, sem correrias, sem contagem regressiva, mesmo que tudo ainda, em lugares assim, respire um permanente dead-line, coisa de quem só sabe trabalhar com a corda no pescoço, com o pescoço na guilhotina, sob ameaça, sob pressão, tal qual se tudo isso fosse justamente o alimento de uma boa rotina. Mas, apesar de tudo, correr contra o tempo continua sendo um tema recorrente, quando não para se movimentar um boing, com seu jeito pesadão, para, com tantas tarefas digitalizadas, encontrar espaço, nessa correria sem fim, para um...toque.

Curioso é que “dar um toque” se transformou, bem antes da tecnologia de ponta apontar para o fim do analógico, numa promessa vã, dessas que são feitas por se fazer, e não para serem cumpridas. Dar um toque é fazer votos de falar, de procurar, quase sempre, a distância, por telefone, digital, claro, numa impossibilidade de aproximação real, a ponto de, ao acaso de um encontro, esbarrando-se pelos corredores desse labirinto sem graça a que chamamos mundo, mais facilmente, cara a cara, liga-se o telefone, para falar com quem esta ali mesmo, a nossa frente, do que se é capaz de, efetivamente, com um afeto que vai ficando, de tão desusado, analógico, dar um toque – e não por não se queira tamanha intimidade, por mais que isso se dê à flor da pele, e sim porque, como um (velho) relógio de pulso, a corda, como ponteiro, contrariando os que mostram, com exatidão exasperante, as horas em dígitos inquestionáveis, o toque se perdeu no tempo, sendo pouco mais, hoje, que uma reminiscência, um passatempo nostálgico para quem ainda tem algum a perder, porque, afinal, estamos, permanentemente, em busca da evolução.

Intrigante, nessa rede, são os furos, cada vez maiores, mas pelos quais, podendo passar um tubarão (até todos, o original e suas continuações), não passa um toque. E se, por descuido, for ao ar uma matéria que, em lugar de exibir as filas, madrugadoras e quilométricas, para comprar, antes dos outros, o telefone da vez, acabe mostrando duas pessoas a se tocarem, ainda que, rigorosamente, dentro da moral-padrão, isso será um escândalo em rede nacional, capaz de derrubar a audiência, acabando com a carreira (que custou tantas correrias) de um(a) jovem jornalista, ávido para mostrar serviço.