A fita métrica não serve para nada: é preciso encontrar um
outro “metro” para mensurar quão grande um homem é.
Lendo, com nostalgia
de velhos almanaques de farmácia – e talvez seja redundante juntar almanaque e
nostalgia, especialmente quando eles são de “pharmacia” –, uma coletânea de
biografias, surge aos meus olhos uma característica, se não como um traço
definitivamente comum a todos eles, a ponto de, num cálculo primário, supor que
se trate de pré-requisito indispensável , pelo menos, salta aos olhos como uma
curiosidade que, caindo em mãos pouco estudiosas, essas vidas-por-escrito,
poderia “conduzir”, se inteligência houver, a uma nova pedagogia: é que muitos
daqueles que têm sua vida ali narrada foram, a se dar crédito aos seus
biógrafos sucinto (o resumo é uma das características dos almanaques), maus
alunos, tornando-se, no entanto, quando homens (ou mulheres), homens (ou
mulheres) de gênio, notáveis. Com isso, rapidamente, vem-me à cabeça (Sir)
Isaac Newton, (Sir) Winston Churchill, (não sei se Sir) Albert Einstein.
Nessa reunião de
tantas vidas, há, inclusive, em epigrafe, frase de Thomas Carlyle, cujo
histórico escolar eu desconheço, e que, por si, é já bastante significativa: “A
história da humanidade não é mais do que a biografia dos grandes homens” – como
se vê, aristocrático e excludente, deixando no ar a questão sobre a importância
dos “pequenos homens” para essa mesma história, para tal humanidade, sendo que
(e para se chegar a essa conclusão não é preciso ser nenhum gênio, haja vista
que até eu cheguei a ela) tamanha grandiosidade a eles atribuída, até
justamente, só existe quando em comparação com outros homens, então, não tão
grandes, talvez nada grandiosos.
Quanto a mim – esse
sujeitinho oculto que sou –, sinto-me, levando a sério aquela frase, para além
do seu valor como frase de efeito, algo “desumano”, sem que tenha cometido
qualquer dessas barbaridades que, por ironia, elevam(!) um homem, pequeno que
seja, fazendo dele, sob um muito peculiar modo de ver as coisas (e o mundo), um
homem dos grandes. Minha biografia é, marcadamente, pobre; e, vergonhas das
vergonhas, nem mesmo consegui ser um mau aluno, o que, mais à frente, caso
típico de otimismo crônico, poderia reacender a esperança de que a humanidade,
ou os que são incumbidos de isso fazer, selecionasse esta minha vida, escrita
em qualquer papel, em algum almanaque perdido no tempo: se isso acontecer, por
já ter uma biografia naturalmente sucinta, seu resumo pode me fazer
desaparecer.
O que chama,
verdadeiramente, a atenção em leituras rápidas, ao gosto da nossa pressa do
dia-a-dia, essa pressa que quer conjugar a si mesma com a pressa em aprender
algo sobre os (grandes) homens, raros os almanaques, é, voltando a atenção para
as leituras rápidas, como esses homens, deixando de lado eventuais “raridades”,
não se percebiam, então, ainda maus alunos, grandes em potencial – é possível
que boa parte dessa sua grandeza confirmada esteja em não se terem apartado do
resto da humanidade para, solitários, escreverem suas (próprias) vidas, com a
declarada, ainda que somente para si mesmos, intenção de entrarem para a
História como um dos grandes, sem, contudo, terem certeza se essa sua
biografia, tão auto, iria ou não parar em páginas de papel cuchê, em edições
que lembram, pelo papel que exercem sobre a moral de leitores apressados, uma
Sagrada Escritura, ou se em folhas de cor imprecisa, em antigas edições de
farmácia, entre um anúncio e outro de um lançamento que promete, a “ferro” e
fogo, tornar maus alunos, chamando de maldade a uma seqüência de lapsos de
memória, em bons entendedores, exortando-os a se comportarem, pois assim hão de
se tornar grandes homens.
Balela! Espertos
foram aqueles que, não podendo fugir à força do braço materno (invencível,
quando com vontade, numa queda-de-braço) a lhes enfiar, goela adentro, em
colheradas insuportáveis, a promessa de genialidade, com essa
tortura-em-solução, sacavam do bolso uma bala, ali escondida como tábua de
salvação portátil, para assim encobrir o amargo da vida com o doce de ser
mau...aluno. E, quem sabe, ter sua vida lembrada pelos outros homens –
estratégia, admitamos, de gênio.
Dos gênios é possível
se dizer algo de mais cientifico, menos especulativo, embora a vida deles,
narrada, não possa, cientificamente, ser contada, quantificada, reduzida a um
denominador que, comum a todos eles, seja sinal confiável de futura grandeza.
Quanto aos “grandes”, tudo é muito instável: não é raro que a grandeza de
alguns lhes seja atribuída por causa, unicamente, da pequenez dos outros. Em
épocas de “baixezas”, pequeno é já grandioso, ou, ao custo de dores na coluna,
seguindo, à risca, a moda, vivem certos homens de salto alto, fazendo-se,
assim, artificialmente, grandes, torcendo(-se) para que seu biografo, o oficial,
generoso para além da verdade, diga dele que até o fim de sua vida não
se...curvou.
CHICO VIVAS
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