Ponce de León morreu!
E cadê a novidade num
fato tão comum a qualquer homem, além de se tratar de alguém já muito antigo na
História?
Mas, esse não era
aquele que buscava, incessantemente, como só costuma se dá com um homem
(teimoso, insistente) a fonte da eterna juventude?
O próprio. Aliás,
como tantos homens, antes dele e após sua morte, pelo que se sabe, passou longe de mostrar em sua face sinais de
que, afinal, encontrou o que passou a vida a buscar, mesmo que muitos de nós
não declarem explicitamente o que fazem em suas caminhadas secretas, dentro ou
fora de si.
Se morreu, imortal
não era, não é. Curiosa, e é isso que me fez ir ao encontro de Ponce de León
(onde quer que ele se encontre, em nossa fantasia de eternidade), é a
costumeira confusão que fazemos com duas palavras que “tomamos” (infelizmente,
não é uma porção daquela tal fonte) como iguais em significado: imortal e
eterno.
Ser imortal é
simplesmente não morrer, mas para isso é preciso que se tenha nascido. Ser
eterno é também jamais deixar de viver, porém, sem nunca ter nascido: o que é
eterno existe desde sempre, não teve começo e não terá fim (para alguns, uma
verdadeira chatice): se tivesse um início, nasceria, e então tudo antes desse
nascimento era um nada, não sendo, portanto, eterno. O que nasce pode até (pode
mesmo?) não morrer, se imortal for, mas eterno, jamais!
Se se quer uma
juventude eterna, é necessário que essa juventude não só não ache seu termo
definitivo, como também que sempre tenha sido justamente isso: e como só se
deseja a juventude porque se nasceu, porque se se tornou jovem (um velho, perto
da criança que nasceu) e teme-se o velho que há de se tornar, o que se busca é
nascer, chegar à juventude e daí para frente ser imortal, sempre jovem.
Imagina só! Se essa
fonte brota e se se pode ter sempre a mesma cara, sem os sinais característicos
do tempo, espécie de asteriscos que remetem nossos olhos para o passado, o que
seria de nós: seriamos, vivendo para sempre, sem sermos eternos, uns jovens com
toda a experiência que só o tempo dá (e não dá de graça, cobrando “de cara” o
seu preço, à vista, cansada, ou a prazo, cansando-nos de tanto pagar) ou
ficaríamos martelando sempre nesses dias de juventude, sem jamais amadurecer?
Eterna juventude!...
Isso não há. Juventude para sempre, a partir da fonte, com dados colhidos nessa
ânsia humana de viver muito, que graça haveria de ter? A menos que alguns
espertos, sempre jovens, com todo o tempo pela frente para serem jovens e
espertos, se apropriassem da fonte, vendendo caro sua água, acessível
tão-somente a quem pode pagar – e se isso, de fato, acontecesse, talvez num
primeiro momento os não-ungidos pudessem morrer (mesmo que ainda naturalmente
jovens) de inveja, antecipando um fim por não poderem partilhar com os
escolhidos dessa juventude a toda prova, imorredoura. Mas, é provável que, com
o tempo, os sempre-jovens, sem demonstrarem isso na cara, por não terem ali as
marcas da própria história, também viessem a morrer de inveja dos simples
mortais, menos por este não viverem para sempre e mais por se diferenciarem, no
rosto, daquela monotonia de traços numa pela lisa, sem as asperezas que
identificam a individualidade em trajetórias que nunca se repetem.
Se eu encontrasse o
caminha da fonte, mesmo que esta estivesse na roça, talvez, como qualquer
mortal, não resistisse, ainda que sem sede e sem um calor no corpo que
justificassem mergulho tão profundo, a ponto de modificar, para sempre, a flor
da pele, à flor da pele. E tendo aprendido o que já sei – e sei que não é
muito: o que pode significar que estou ficando maduro –, minha face de mim uma
coisa, enquanto minhas memórias, outra, num embate em que o ridículo e o
patético se digladiariam pela primazia de reinar absolutos num homem cujas
palavras que lhe saem da língua, a mesma que “sabe” à água, são já algo
maduras, enquanto que o olhar se reveste, numa perspectiva imortal, de
esperança sempre verde: acreditar na (própria) língua ou, propriamente, nos
olhos?
Se a resposta for
“nos olhos”, jovem por todo o sempre, desde a água da fonte, para que palavras?
Se responder “nas palavras”, confiando-se nelas, para que o encanto de (se)
olhar nos olhos?
CHICO VIVAS
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