Ouvi. E não quero, com isso, dizer que escutei, no
passado, dando prova, assim, de que costumo dar ouvido a ele. O que desejo
falar – será que haverá alguém disposto a me dar ouvidos? – é...
Em verdade, não sei o
que quero, ainda que saiba, e disso eu sei, o que falar, não sabendo, no
entanto, a quem, com aquele OUVI, ainda a tão pouca distância, eu me dirijo,
sem “carta” à mão, sem levar a mão à carteira, ziguezagueando como vou, num
traçado típico de quem não sabe (se) dirigir, ou, se sabe, está, então, sob
efeito entorpecente; tropeçando como vou, mesmo sem notar nenhuma pedra a minha
frente, uma que, indo de encontro com meu pé – este, na verdade, indo ao
encontro dela, mesmo que nem um nem outra tenham tanta independência, tanta vontade
própria assim para decidirem, por si, onde esbarrarem –, acabe por me dar um
(bom) motivo para soltar, sem temor de ser ouvido, mesmo que dizendo isso só de
mim para mim, não tendo, portanto, a intenção de “ver” minha voz ecoar, um
sonoro palavrão.
O fato é que ouvi. E
não desejando passar isso adiante, deixo o que escutei no passado, ainda que
possa considerar que o prazo de validade (do que ouvi) não se esgotou, o que
garante sua utilidade, se alguma tiver, sendo um desperdício, ao menos, para os
que gostam de passar à frente o que ouviram, deixar, simplesmente, isso para
lá, em nome, talvez, de uma conduta que sequer (me) é natural, tendo-me
apropriado dela por pura convenção, por necessidade, quem sabe, de parecer mais
civilizado, sábio até: embora se costume atribuir aos (verdadeiros) sábios,
como certificado, inclusive, dessa sua sabedoria, o fato de serem mais dados,
justamente, a ouvir do que a falar.
No fundo, o que ouvi,
tendo ouvido de mim mesmo, escapou-me...do íntimo, lá do fundo – e não de um
fundo em que costumam ficar os bolsos, em que se guardam as carteiras e,
eventualmente, uma “carta”; e não de um íntimo que não passa de palavra
superficial para simular uma profundidade de efeito. O que ouvi me saiu
naturalmente, porque, em mim, é mesmo natural lembrar, sem que eu atribua a
isso uma qualidade capaz de coroar como sábio, daqueles que gostam de ouvir
mais do que de falar, tão-somente um tácito, um que, não sabendo o que dizer,
fecha-se em si, e não diz mais nada.
Eu não! Tácito, não nego,
sou. Sábio – ah! como gostaria de isso negar –, não sou. Íntimo, sou de poucos.
Quanto a ser profundo, em geral, isso é uma “chatice”. Eu (me) lembro. E para
que não (me) venham dizer que ouço demais e falo de menos, só mais uma
palavrinha... (duas, na verdade)
CHICO VIVAS
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