Mama mia! E, desta vez, a mamada (ou será mais uma mamata,
já que, às vezes, o que se toca, como neste assunto, agora, é uma tocata) não
se dará nas tetas...da vaca, mas, em iguais úberes da porca.
É que a porca
miséria, orgulhosa como só ela – porque, contrariando algumas expectativas,
também a miséria pode, querendo posar de humilde, revelar-se, ao fim, muito
orgulhosa, e nisso não estará tão só assim –, de sua origem italiana, não
importando, embora, com tal nacionalidade, entre nós, seja persona(?)
importada, que tenha vindo de chiqueiro semelhante aos que há em qualquer outro
lugar do mundo, atendendo este a exigências naturais das porcas, sem que a
lavagem que se lhes é oferecida signifique, afora o preconceito bíblico provado
pelo filho pródigo, necessariamente, evidência de miséria batendo à porta,
achando, a porca em questão, chique, somente por esse acento italiano,
chegando, tanto que vive com seu focinho empinado, a cuspir, em quem se
disponha a lhe oferecer a cara, dando-lhe ouvidos, mesmo que a maioria prefira
lhe virar a face, sem oferecer a outra, esse seu passaporte mediterrâneo,
dizendo-se, quase ficando nos cascos (se os tivesse), se alguém para isso torce
o nariz, legítimo presunto de Parma.
Como (e eu não sou
desses) se sabe (será que sou desses?), presunto assim não é para qualquer um;
menos ainda para quem está à beira da miséria, sentindo-se até um porco, seja
pelas concessões que tem, agora, de fazer, em nome da saciedade de uma
necessidade tão primária, a certos pudores, alimentado em anos de fartura, a
ponto de um pão amassado pelo diabo, quentinho, considerando de onde vem, ser
fina iguaria, se comparado ao que é obrigado a comer: e bem que o diabo
poderia, no meio desse seu pão, intrometer umas boas fatias de presunto – se de
Parma, Dio santo, seria o “paradiso”.
No que diz respeito à
miséria, essa mesma para a qual alguns, nada miseráveis, nada que se compare
aos miseráveis de verdade, embora, filósofos, façam dela, da verdade, seu pão
de cada dia, cobram respeito, ela não conhece fronteiras, ainda que possa
sentir maior atração, talvez por ser aí mais bem recebida, por certos grotões,
alguns incrustados em aparente opulência, despertando até a desconfiança de que
se trata, já suprida, entre os opulentos, as necessidades mais imediatas, as
mediatas, as (necessidades) que sequer são tão necessárias assim, de um arranjo
estético, patrocinado pela opulência (em pessoas), criando esse contraste entre
o muito e o bem pouco, porque também os poucos com muito se nutrem do que
chamam de arte, reclamando, com voz nas alturas, mesmo que o façam com a
discrição dos sussurros, seu direito a uma expressão estética, mesmo que para
isso tenham de recorrer a uma porca, a várias misérias, até, diante do
resultado, mesmo que não se trate de italiano de verdade, sem nenhum parmegiano
entre seus ascendentes, sem segurar a própria língua, soltam um “porca
miséria”, orgulhosos de si, dessa obra que junta sua opulência barroca ao
minimalismo (do) miserável.
Presunto de Parma? Já
me dou por satisfeito com um apresuntado; na falta deste, com um pão besuntado
com manteiga: e não admito a falta desta, porque até um miserável tem lá seu
orgulho.
CHICO VIVAS
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