sábado, julho 19, 2008

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Amigos, amigos. E o negócio é que, à parte eles, nada resta de lucrativo na vida. Tutti amici, mesmo que não o sejam todos entre si.

Talvez, pensando mais em si mesmos, haja amigos (de quem?) que se orgulham de ter os seus, e muito, com uma disposição que dá a impressão de que existem, de que vivem só para isso, para ajudá-los, esses seus amigos, em caso de necessidade (quem não as tem?), sem que precise chegar ao extremo de uma extrema necessidade (embora muitos a tenham), porque chegar a esse ponto nenhum dos seus tantos amigos há-de deixar: e estes são do tipo (de amigos) que contam os seus à mão cheia, juntando as duas; e mais, se (as) tivessem.

Outros, de um outro tipo (de amigo), o que não os exime de pensarem também em si mesmos, gozam a vida por contarem com o afeto dos (seus) amigos, e, entre estes, há um sub-grupo que, sobre os seus (seus amigos, seus afetos, seu afeto por seus amigos), nada contam, embora, intimamente, contem com a inexatidão característica dos afetos, os que têm: tanto à mão (porque a mão é um forte elo de afeto entre amigos), quanto os que estão a léguas (e, nesse caso, o afeto tem a função de uma mão, atravessando o espaço, a puxar o amigo para mais perto).

Um outro sub-grupo do grupo de amigos que pensam nos seus (quando não estão pensando em si), com base no afeto, conta, para quem quiser lhe dar ouvidos, muito sobre seus amigos e seus afetos – tanto afetos seus, quanto afetos de seus amigos, que eles julgam, por um cálculo extensivo a si mesmos, amigos sub-agrupados aqui, serem, igualmente, afetos seus.

De todos – e não sei quantos são –, quem faz melhor negócio, se os amigos que cultivam amigos com uma perspectiva mais pragmática (“Se eu precisar de ajuda, sempre posso contar com meus amigos”) ou os que enxergam os seus pelas lentes do afeto (entre estes, os que contam e os que não contam, a respeito dos amigos que têm), eu não sei responder.

Se alguém tem amigos, o negócio já está feito – e já começa lucrativo. Mas, à parte a rentabilidade, apesar desta fazer parte do negócio (assim se deseja que seja), quem sabe se não seria melhor uma postura mais conservadora, sem apostar todas as fichas no risco elevado dos afetos, tão voláteis, por natureza, pois estes, que, um dia, fazem ninho, pondo aí a promessa de reprodução em série, outro dia, simplesmente, voam – porque são assim, porque isso é de sua natureza, sem que se queira dizer, com sua decolagem, que não são os amigos que se imaginou.

Embora amigos sejam, sim (e não me virem a cara, ao me ouvirem dizer isso, meus amigos mais românticos), um negócio, e dos bons, nosso poder de escolha está limitado pelo desejo do outro (em ser nosso) amigo. Mas há algumas combinações possíveis. A primeira, amigo pragmático + amigo pragmático. Segunda, amigo pragmático + amigo afetuoso. Terceira, amigo afetuoso + amigo afetuoso.

E não nos iludamos com supostas afinidades entre iguais ou com a velha idéia de que os opostos sentem uma irresistível e recíproca atração: é preciso considerar a pessoa do amigo, a pessoa sob o amigo.

Dito tudo isso, assim como foi dito, surge, de repente, a amizade, como um intrincado negócio que envolve sofisticados cálculos, mesmo quando se trata de “simples amigos”, a quase requerer uma matemática todo-própria, uma engenharia financeira genial para se poder chegar a um bom resultado.

E talvez, afinal, só haja mesmo...amigos. Essa espécie de título de capitalização que ora nos esquecemos de tê-lo “comprado”, empenhando nossas esperanças num futuro mais tranqüilo, pensando em seu resgate só no caso (que não esperamos experimentar) de extrema necessidade, ora esquecemo-lo, de caso pensado, por simples cálculo, mas não para assim deixarmos de lado o amigo, e sim para, título com seu nome, não o esquecer jamais, em meio a tantos “negócios”, à parte as negociatas em que nos envolvemos, mesmo involuntariamente.

Importa é que falemos de amigos, falemos de afeto(s), e até, pragmáticos que sejamos, misturado a tudo isso, que falemos de nós mesmos. Afinal, somos ou não somos...tutti amici?


sexta-feira, julho 04, 2008

CHOREI, CHORARE






á tinha ouvido falar, embora jamais tenha presenciado cena assim – comovente para uns, para outros, apenas apelativa – das lágrimas de crocodilo, nunca me tendo atracado com um, mesmo que para um exótico abraço, pressionando, por fora, aquelas suas glândulas que, como mecanismo precisamente acionado durante a comilança sem requintes de civilidade, fazem-nos, a indivíduos desse gênero (para não dizer a gente dessa raça), verter lágrimas: o que, a nossos olhos tão dados a paixões exacerbadas, parece um chororô sofrido, que nos toca profundamente, quase a nos levar a uma carícia na cabeça do bicho, sem, então tomados pela emoção, atentarmos para o risco, ali, tão próximos como já nos achamos de suas instintivas presas, presos nós por alguma culpa sem nome, predador esse crocodilo que, numa experiência sensacional, vai ao pranto justamente por estar gozando do alimento necessário – já que, em se tratando de ser que não homem, dizer do alimento que é o “desejado”, é já apelar para uma prosopopéia.

Vá lá: jacaré! isso ainda passa, ainda que eu não seja daqueles que, para demonstrar, publicamente, uma coragem que na verdade não tem, faça qualquer questão de passar por perto de um. Mas, uma águia...isso já é demais para nossas assentadas noções de altivez. Afinal, onde foi parar aquele olhar arguto, que sobrevoa (a) tudo, mesmo quando (esse) tudo não passa do nível mais rasteiro, aqueles olhos que enxergam longe, aquelas presas retráteis – recuam, talvez para não mostrar, de cara, do que são capazes, e avançam na hora certa –, aquele bico que, se nariz, bem poderia ser um sinal de astúcia, e, enfim, toda aquela sua pose imperial(ista): onde foi parar?

Não me venham, agora, rastejante jacaré, sem sequer ser tratado por um Crocodilo, querer que eu chore por causa de uma atitude piegas, indigna de uma ave tão sagaz, dessa águia. Choro, antes, consumidor de folhetim barato, por gêmeos, por gêmeas que, sem que se espere por isso (como nos bons folhetins que nos pegam de surpresa, forçando lágrimas imprevistas no meio de um sorriso de vitória), sendo destruídos(das) pela força, maligna mas inteligente, de um vilão, oculto nas sombras, deixando-nos a impressão de que é feio, conduzidos que somos, pela mão manipuladora de um bom novelista, a acreditar que é justamente para se vingar do mundo, por causa de sua feiúra (que culpa temos nós?), que se atirou assim sobre as pobres gêmeas – embora, saibamos, pela história, que são meninas ricas e, como águias, tantas vezes olhando tudo do alto.

Sinto por elas, por essas gêmeas, construídas pelas mãos experientes de um demagogo para serem firmes torres de uma história edificante, até, pelo menos, que um crítico, como se fosse um perito em obras desse gênero, achasse, trazendo isso a público, os buracos comprometedores. Mas, a essa altura, quem lê e gosta do que lê, pouco se importará que os tais buracos se revelem crateras para as quais não se pode fechar os olhos, porque há delícia em, junto com as gêmeas, ir tão alto, mesmo que nunca saiamos do nosso nível tão terreno (e daí para baixo), delícia semelhante a de ir ao chão, quando – coitadas das gêmeas – elas caem.

Todo folhetim que se preze, para prender o leitor, faz o mocinho, a mocinha, um deles, sofrer, página atrás de página, preparando a grande revanche, quando o vilão, afinal, terá sua face (monstruosa) exibida em cadeia internacional. Mas, e isso é outro truque dos manipuladores, o mal pode, ao contrário do que tanto gosta nossas aspirações cristãs, ter uma face bela – e há cristãos que vêem nisso o reforço de sua crença, argumentando que o mal sempre se apresenta assim, belo, para seduzir os que insistem no “terreno”. Em caso assim, lamentar as gêmeas? saudar o mal? achar, subitamente, buracos onde tudo parecia uma estrada celestial? ou, simplesmente, chorar de raiva por ter-se deixado levar, como se diante da mais terrível realidade, por uma ficção digna de uma águia dos folhetins?